domingo, 12 de agosto de 2012


O Doce Néctar: Chablis – Um tesouro branco


        Referência mundial quando se fala em vinhos brancos elaborados a partir de Chardonnay.



A origem: A antiga Yonne.


   Um verdadeiro tesouro vinífero. Chablis é o único sobrevivente da antiga região produtora de vinhos de Yonne. As vinhas de Chablis foram introduzidas pelos romanos, mas foram os monges da igreja medieval que estabeleceram a viticultura como importante atividade econômica. Provavelmente tenha sido esses religiosos que começaram a produção de vinhos na região; Há relatos sobre a exportação de Chablis para a Inglaterra e Flandes em meados do século XV. Até o Século XIX, toda Yonne se desenvolvia como região produtora de vinhos. Tal sucesso dava pela facilidade do transporte do vinho por via fluvial até Paris. Por isso houve um declínio no final daquele século, por conta das pragas Oídio e a Filoxera, embora na época já se houvesse descoberto solução para solução para esse dois problemas, muitos produtores relutaram em substituir suas vinhas, pois a inauguração da estrada de ferro Lyons-Marseille havia facilitado o transporte de vinhos de outras regiões e reduzido a participação de Chablis no mercado (que havia perdido a vantagem de proximidade com Paris). As áreas de cultivos foram sendo reduzidas até atingir o nível de meros 500 hectares, por volta de 1950. Quando o prestigio da denominação reviveu a partir do compromisso dos produtores com a qualidade de seus vinhos e advento de novas tecnologias, que permitiram que Chablis pudesse, novamente, produzir seus brancos com maior lucro e competitividade. A denominação foi criada no ano de 1938, quando o Institut National dês Appellations d’Origine Contrôllée (INAO), determinou que os vinhos deviam ser produzidos a partir da variedade Chardonnay e delimitou áreas de cultivo e práticas de vinificação, tudo isso para proteger o uso indiscriminado do nome “Chablis”, que estava sendo utilizado para descrever qualquer vinhos branco feito no mundo. Mas somente no final do século XX que os mercados se abriram para Chablis, intensificando sua produção e consumo. Até 2004 havia 10 mil hectares de vinhedos plantados na região. O clima: Um fator essencial. A região de Chablis possui clima Semicontinental, sem influência marítima, isso quer dizer que, os invernos são longos e rigorosos e os verões, com freqüência, razoavelmente quentes. Geralmente esse tipo de clima torna os vinhos locais mais acidez e sabores menos frutados do que os apresentados por Chardonnays oriundos de regiões mais quentes. Os Chablis freqüentemente apresentam notas de “pólvora” ou sabor metálico (no bom sentido). Há sempre uma incerteza a respeito do clima e, assim, a produção oscila bastante conforme a safra, tanto em qualidade quanto em quantidade. Em anos muitos chuvosos e de temperaturas muito baixas, a tendência é a produção de vinhos de acidez extremamente alta e fruta magra para contra balancear essa acidez. Já em safras muitos quentes tendem a produzir vinhos cheios e flácidos, com muito pouca acidez. A cima do fator tópico temperatura, a maior questão climática do local são as geadas. Especialmente porque elas acontecem na primavera, período crucial no ciclo da vinha, pois corresponde à época de abertura dos botões das suas flores. A importância da ocorrência ou não de geadas e tanta que acaba por determinar quanto vinho será produzido em determinado ano.      
Por isso, a proteção dos vinhedos contra o fenômeno é uma das maiores preocupações dos produtores da região. Desde 1950, vários métodos foram desenvolvidos para proteger as plantas. Antes disso, os viticultores estavam à mercê da natureza, esperando que a temperatura se mantivesse quente o suficiente durante a primavera, de modo a viabilizar a produção. Aquecedores instalados nos vinhedos e aspersores de água, acionados para borrifar as vinhas assim que a temperatura cai até o ponto de congelamento e matindos durante todo o tempo necessário, estão entre as medidas preventivas. Hoje em dia a maioria das melhores vinícolas faz uso desses métodos para garantir sua safra. Alguns chegam a utilizar helicópteros para circular o ar e dissipar flocos de gelo.

  • O solo: Um segredo Pré-Histórico

.     O grande segredo para desvendar Chablis esta em sua geologia, em seu solo argilo-calcario. De fato, a região esta sobre uma grande bacia submersa de calcário, que propicia o sabor único de seus brancos e também delimita as áreas produtoras. As rochas do local datam da Era Jurássica superior, algo em torno de 180 milhões de anos atrás. Sobre essas rochas há uma camada de argila muito rica em fosseis marinhos, minúsculas cascas de ostras fossilizadas. Antigamente somente os vinhedos plantados sobre o solo de argila Kimmeridgiana (Kimmeridgean clay) podia carregar a denominação Chablis. Mais recentemente, a denominação estende-se também a áreas de Portlandian clay, de estrutura semelhante à da primeira. Os dois solos têm a mesma origem geológica. Entretanto, de modo geral, Portlandian clay não confere tanta finesse ao vinho quanto Kimmeridgean clay. Fica fácil perceber que os vinhedos Grand Cru estão todos sobre kimmeridgean clay, enquanto que Portlandian clay constitui o solo da maioria das vinhas periféricas produtoras de Petit Chablis.

  • Classificações: Os vinhedos são o destaque

.   Na denominação Chablis existem quatros classificações, as quais apresentam características distintas entre si, refletindo a importância das diferenças de solo e de cada encosta da região, ainda que a uva-base seja a Chardonnay.

  • Chablis Grand Cru AOC

   No patamar superior estão sete vinhedos Grand Cru. Ocupando uma área total de 100 hectares, estão situados em uma das encostas ao norte da cidade de Chablis, com face sudoeste. Juntos, eles são responsáveis por aproximadamente 3% da produção anual de Chablis. São eles:
  • Les clos - Tende a apresentar os Chablis mais ricos e complexos. Com mineralidade pronunciada. Com o tempo os vinhos desenvolvem aromas parecidos com os Sauternes.
  •  Vaudésir – por sua vez produz vinhos com sabor intenso e notas de especiarias
  •  Valmur - são conhecidos pela sua textura suave e seu nariz aromático.
  •  Les Preuses – Por ser o vinhedo que recebe maior incidência de raios solares, tende a ter os vinhos de maior corpo.
  • Bougros – É o menos expressivo, mas ainda assim produz brancos de sabores vibrantes de frutas.  Blanchot – São delicados com aromas florais.
  • Grenouilles – São muito aromáticos, elegantes e atrevidos.
  •  La Moutonne - É uma pequena colina entre os vinhedos de Vaudésir e Les Preuses, e por razões ilógicas e talvez burocráticas não conta com o Status de Gran Cru, embora seus vinhos apresentem qualificação para ostentá-la. Sendo este um “Grand Cru não oficial”, uma vez que o INAO não o reconhece como tal.


  • Chablis Premier Cru AOC

    Em Segundo lugar, em termos de qualidade estão os vinhedos Premier Cru. No começo do século XXI, somavam ao todo 40 vinhedos, os quais cobrem uma área de 750 hectares. Dentre os vinhedos mais renomados estão Montée de Tonerre, Vaillons e Fourchaume. Se comparados aos Chablis clássicos, os Premier Cru normalmente apresentam fruta mais madura – com toques cítricos ao invés de ameixas ou maçãs-verdes – mais corpo e, provavelmente, uma textura mais suave e cremosa, alem de maior concentração e de acidez, e aromas mais minerais. Embora existam 40 vinhedos Premier Cru, os nomes da maioria deles não aparecem nos rótulos dos vinhos. Usando algo que usualmente se chama de “umbrella names”, ou seja, vinhedos menores podem usar o nome de vinhedos Premier Cru próximos mais famosos. Algo permitido pelo INAO. Em geral, 17 são os vinhedos “umbrella”, os demais acabam mesmo sendo lançados ao mercado sob esses nomes.

  • Chablis AOC
   Continuando a ordem de qualidade, após os Premier Cru estão os Chablis AOC, com uma área de produção totalizando 2.860 hectares, a maior extensa da denominação e a que apresenta a maior variação entre seus produtores e qualidade de safras. Os Chablis AOC podem ser bastante austeros, com toques de frutas brancas verdes e acidez alta. Os melhores rótulos mostram um toque mineral defumado e calcário, bem característico dos vinhos Premier Cru e Grand Cru.

  • Petit Chablis
   A mais humilde classificação da denominação são os Petit Chablis, incluindo as áreas mais periféricas da região. Até 2004, de um total de 1.800 hectares permitidos na denominação Petit Chablis, 560 estavam cultivados. Os Petit Chablis são os brancos mais simples produzidos na região.


  • Envelhecimento em carvalho: Tradicionalistas x Modernistas.
     Como ocorreu em outras regiões francesas, Chablis se viu em meio a uma série de avanços na vinificação. Podem ser citadas a introdução da fermentação malolática e, também, do controle de temperatura durante a fermentação. Porem o assunto mais controverso entre os produtores da região é o uso do carvalho. Tradicionalmente, os vinhos de Chablis eram envelhecidos em antigos barris de madeira muito usada, demoninados feuilette – de capacidade aproximada à metade dos barris da Borgonha, 228 litros – os quais eram neutros e não conferiam sabores característicos do carvalho – tais como baunilha, tostados etc – à bebida. Havia certa dificuldade em manter os padrões de higiene nos feuilette e, em conseqüência, havia propensão ao aparecimento de defeitos no vinho. Por isso, com advento dos tanques de fermentação em aço inoxidável, os feuilettes foram gradativamente substituídos. O que aconteceu foi que, no final do século XX, o uso do carvalho foi por assim dizer “redescoberto” por enólogos de Chablis, que começaram a usar barricas novas que, essas sim, influenciavam no sabor do vinho. Nasceu aí uma grande controvérsia: enquanto os tradicionalistas dispensavam o carvalho para a manutenção do estilo e expressão pura do terroir de Chablis, enólogos modernos abraçaram o uso dos barris, cuidando apenas para que não houvesse excessos que viessem a assemelhar seus brancos a Chardonnays do Novo Mundo. Um detalhe importante é o teor de tosta dos barris utilizados em Chablis, normalmente é muito baixo, o que reduz, conseqüentemente, o sabor tostado a ser percebido no vinho. Os que abraçaram o carvalho apontam que ele permite oxigenação durante o processo de fermentação, o que torna o vinho pronto para consumo rápido. Mesmo entre os que fazem o uso do carvalho, fermentam ou envelhecem o vinho no carvalho mais neutro. Raramente ambos os processos ocorrerão em barris. Pessoalmente acho que Chablis continua sendo um dos melhores brancos do mundo, senão o melhor. Embora muitas vezes ofuscados erroneadamente pela opulência dos bons Meursault e Corton-Charlemagne, mas com uma singularidade que o distancia dos grandes brancos borgonheses de Côte D´or. Seu caráter mineral único, sua acidez “metálica” e seu estilo austero inigualáveis. Não encontrado em nenhum outro lugar do mundo!



Por: Marcelo Carvalho

Fontes: Revista Adega (Ed. Ano 6 nº75)/Atlas do Vinho/Bíblia do Vinho.

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